terça-feira, 16 de junho de 2009

Boca de festa rouge

Foto de Fernando Lessa.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Antimediocridade

Avant la haine
Lui: Sais-tu ma belle que les amours
Les plus brillantes ternissent
Le sale soleil du jour le jour
Les soumet au suplice
J'ai une idée inattaquable
Pour éviter l'insupportable
Avant la haine, avant les coups
De sifflet ou de fouet
Avant la peine et le dégout
Brisons-là s'il te plaît
Elle: Mais je t'embrasse et ça passe
Tu vois bien
On s'débarrasse pas de moi comme ça
Tu croyais pouvoir t'en sortir,
En me quittant sur l'air
Du grand amour qui doit mourir
Mais vois-tu je préfère
Les tempêtes de l'inéluctable
À ta petite idée minable
Avant la haine, avant les coups
De sifflet ou de fouet
Avant la peine et le dégout
Brisons-là dis-tu
Lui: Mais tu m'embrasses et ça passe
Je vois bien
On s'débarrasse pas de toi comme ça
Lui: Je pourrais t'éviter le pire
Elle: Mais le meilleur est à venir
Ensemble: Avant la haine, avant les coups
De sifflet ou de fouet
Avant la peine et le dégout
Lui: Brisons-là s'il te plaît
Elle: Mais je t'embrasse et ça passe
Tu vois bien
Ensemble: Avant la haine, avant les coups
De sifflet ou de fouet
Avant la peine et le dégout
Elle: Brisons-là dis-tu
Lui: Mais tu m'embrasses et ça passe
Je vois bien
Lui: On s'débarrasse pas de toi comme ça
Elle: On s'débarrasse pas de moi comme ça

Música bem bonita do filme Em Paris, que é bem bom. E quem não souber francês que se débrouille. Tem umas traduções pela net que eu vi e achei ruins. E fiquei com preguiça de fazer uma tradução decente. E se débrouiller é se virar. ;)

Boca de festa noir

Foto do amigo e fotógrafo Fernando Lessa. Sempre para lento deleite. Adoro.

domingo, 14 de junho de 2009

Para Lori Léo

A bunda, que engraçada

Carlos Drummond de Andrade
A bunda, que engraçada.
Está sempre sorrindo, nunca é trágica.
Não lhe importa o que vai pela frente do corpo.
A bunda basta-se.
Existe algo mais? Talvez os seios.
Ora - murmura a bunda - esses garotos
ainda lhes falta muito que estudar.
A bunda são duas luas gêmeas em rotundo meneio.
Anda por sina cadência mimosa, no milagre
de ser duas em uma, plenamente.
A bunda se diverte por conta própria.
E ama.
Na cama agita-se. Montanhas avolumam-se, descem.
Ondas batendo numa praia infinita.
Lá vai sorrindo a bunda.
Vai feliz na carícia de ser e balançar.
Esferas harmoniosas sobre o caos.
A bunda é a bunda,
redunda.
"A vida é crua. Faminta como um bico de corvos. E pode ser tão generosa e mítica: arroio, lágrima, olho-d’agua, bebida. A vida é líquida."
Hilda Hilst

Delicatéssen?

Delicatessen
Crônica de Hilda Hilst
Você nunca conhece realmente as pessoas. O ser humano é mesmo o mais imprevisível dos animais. Das criaturas. Vá lá. Gosto de voltar a este tema. Outro dia apareceu uma moça aqui. Esguia, graciosa, pedindo que eu autografasse meu livro de poesia, "tá quentinho, comprei agora". Conversamos uns quinze minutos, era a hora do almoço, parecia tão meiga, convidei-a para almoçar, agradeceu muito, disse-me que eu era sua "ídala", mas ia almoçar com alguém e não podia perder esse almoço. Alguém especial?, perguntei. Respondeu nítida: "pé-de-porco". Não entendi. Como? "Adoro pé-de-porco, pé-de-boi também". Ahn... interessante, respondi. E ela se foi apressada no seu Fusquinha. Não sei por que não perguntei se ela gostava também de cu de leão. Enfim, fiquei pasma. Surpresas logo de manhã.
Olga, uma querida amiga passando alguns dias aqui conosco, me diz: pois você sabe que me trouxeram uma noite um pé-perna de porco, todo recheado de inverossímeis, como uma delicadeza para o jantar? Parecia uma bota. Do demo, naturalmente. E lendo uma entrevista com W. H. Auden, um inglês muito sofisticado, o entrevistador pergunta-lhe: "O que aconteceu com seus gatos?" Resposta: "Tivemos que matá-los, pois nossa governanta faleceu". Auden também gostava de miolo, língua, dobradinha, chouriços e achava que "bife" era uma coisa para as classes mais baixas, "de um mau gosto terrível", ele enfatiza. E um outro cara que eu conheci, todo tímido, parecia sempre um urso triste, também gostava de poesia... Uma tarde veio se despedir, ia morar em Minas... Perguntei: "E todos aqueles gatos de que você gostava tanto?" Resposta: "Tive de matá-los". "Mas por quê?!" Resposta: "Porque gatos gostam da casa e a dona que comprou minha casa não queria os gatos". "Você não podia soltá-los em algum lugar, tentar dar alguns?" Olhou-me aparvalhado: "Mas onde? Pra quem?" "E como você os matou?" "A pauladas", respondeu tranqüilo, como se tivesse dado uma morte feliz a todos eles. E por aí a gente pode ir, ao infinito. Aqueles alemães não ouviam Bach, Wagner, Beethoven, não liam Goethe, Rilke, Hölderlin(?????) à noite, e de dia não trabalhavam em Auschwitz? A gente nunca sabe nada sobre o outro. E aquele lá de cima, o Incognoscível, em que centésima carreira de pó cintilante sua bela narina se encontrava quando teve a idéia de criar criaturas e juntá-las? Oscar, traga os meus sais.
Eat, drink and love;
what can the rest avail us?
Byron

Tirada de Cartola

O mundo é um moinho
(Cartola)


Ainda é cedo, amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora de partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar



Preste atenção, querida
Embora eu saiba que estás resolvida
em cada esquina cai um pouco tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és



Ouça-me bem, amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões a pó



Preste atenção, querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás à beira do abismo
Abismo que cavaste com os teus pés
"Be of heart, and fear nothing."
Edgar Allan Poe

Tô com Poe e não abro.

Para lento deleite IV

Why´s it so hard
(M. Ciccone/S. Pettibone)
Why's it so hard to love one another
Why's it so hard to love
What do I have to do to be accepted
What do I have to say
What do I have to do to be respected
How do I have to play
What do I have to look like to feel I'm equal
Where do I have to go
What club do I have to join to feel I'm worthy
Who do I have to know
I´m telling you brothers, sisters
Why can´t we learn to challenge the system
Without living in pain
Brothers, sisters
Why can´t we learn to accept that we´re different
Before it´s to late
What do I have to learn to know what´s the right for me
What do I have to know
What am I gonna do when I feel righteous
Where do I have to go
Who should get to say what I believe in
Who should have the right
What am I going to do with all this anger
Why do I have to fight
Bring your love, sing your love
Wear your love, share your love
Brothers, sisters
What do I have to say
Brothers, sisters
How do I have to play
Brothers, sisters
Why do I have to fight
Why´s it so hard to love one another
Love your sister, love your brother
Bring your love, sing your love
Wear your love, share your love


Música da deeva Madonna. Essa letra pra mim é um poema. E a performance da música na turnê The Girlie Show é tu-do.

Para lento deleite III

Este eu achei digno de ser copiado do blog da amada amiga Mari (que também é um lento deleite). É uma conferência do Foucault traduzida e transcrita por Marcelo Coelho.



"Basta eu acordar que não posso escapar deste lugar, o meu corpo. Posso me mexer, andar por aí, mas não posso me deslocar sem ele. Posso ir até o fim do mundo, posso me encolher debaixo das cobertas, mas o corpo sempre estará onde eu estou. Ele está aqui, irreparavelmente: não está nunca em outro lugar. Meu corpo é o contrário de uma utopia. Todos os dias eu me vejo no espelho: rosto magro, costas curvadas, olhos míopes, nenhum cabelo mais... Verdadeiramente, nada bonito. Meu corpo é uma jaula desagradável. É através de suas grades que eu vou falar, olhar, ser visto. É o lugar a que estou condenado sem recurso. É possível que contra esse corpo tenham nascido todas as utopias, dele nasce a utopia original -- a de um corpo incorporal: o país das fadas, dos elfos, dos gênios, onde as feridas se curam imediatamente, onde caímos de uma montanha sem nos machucar, onde podemos ficar invisíveis. Há outra utopia dedicada a desfazer o corpo, é o país dos mortos. A múmia é o corpo utópico que desafia o tempo. Há as pinturas e esculturas dos túmulos, que prolongam uma juventude que nunca vai passar, que será eterna. Meu corpo se torna sólido como uma coisa, e eterno como um deus. A outra, a maior utopia criada contra o corpo, é o grande mito da alma, que funciona maravilhosamente dentro do meu corpo, mas escapa dele. É bela, pura, branca, ao contrário do meu corpo. Durará para sempre. É meu corpo luminoso, purificado. Assim, pela mágica dessas utopias, meu corpo pesado e feio desaparece magicamente. Recebo-o de volta fulgurante e perpétuo. Mas meu corpo, nele mesmo, seus recursos próprios de fantástico. Tem lugares sem-lugar. Tem seus lugares obscuros e praias luminosas. Minha cabeça é uma estranha caverna, com duas aberturas, meus olhos. E, se as coisas entram na minha cabeça, ficam ao mesmo tempo fora delas. Corpo incompreensível, penetrável e opaco, aberto e fechado: corpo utópico. Absolutamente visível -- porque sei o que é ser visto e ver os outros. Mas esse corpo é também tomado por uma certa invisibilidade: minha nuca, por exemplo. Minhas costas: conheço seus movimentos, sua posição, mas não as vejo. Corpo que é um fantasma, que só posso ver pelo truque, pela miragem de um espelho. Esse corpo não é uma coisa: anda, mexe, quer, se deixa atravessar sem resistências por minhas intenções. Só quando estou doente – dor de estômago, febre -- ele se torna coisa, opaca, independente de mim. Não, o corpo não precisa de fadas e almas para ser utópico, visível e invisível, transparente e concreto. Para que eu seja utopia, preciso apenas ser... um corpo. As utopias não apagam o corpo: nasceram dele, para só depois, talvez, voltarem-se contra ele. Uma coisa, entretanto, é certa: o corpo humano é o ator principal de todas as utopias. O sonho de um corpo imenso, o mito dos gigantes, de Prometeu, é uma utopia. O sonho de voar também. O corpo é também ator utópico quando se pensa nas máscaras, na tatuagem, na maquiagem. Não se trata, aqui, propriamente, de adquirir um outro corpo, mais bonito ou reconhecível. Trata-se de fazer o corpo entrar em comunicação com poderes secretos, forças invisíveis. Uma linguagem enigmática e sagrada se deposita sobre o corpo, chamando sobre ele o poder de um deus, a força surda do sagrado, a vivacidade do desejo. Fazem do corpo o fragmento de um espaço imaginário, que entra em comunicação com o universo dos outros, dos deuses, das pessoas que queremos seduzir. O corpo é arrancado de seu espaço próprio e arremessado a um outro espaço. As vestimentas religiosas, por exemplo, fazem o indivíduo entrar no espaço cercado do sagrado, ou na comunhão da sociedade. Tudo o que toca no corpo, uniformes, diademas, faz florescerem as utopias internas do corpo. E a carne nela mesma pode ser também utópica. Faz o corpo voltar-se contra si: o outro mundo, o contra-mundo, penetra nesse corpo, que se torna produto de seus fantasmas: o corpo de um dançarino, por exemplo, é um corpo dilatado pelo espaço – espaço que lhe é interior e exterior ao mesmo tempo. O corpo do mártir acolhe a dor e a salvação. O corpo de um drogado, de um possuído, de um estigmatizado, recebe em si o que lhe é exterior. Bobagem dizer portanto, como fiz no início, que meu corpo nunca está em outro lugar. Meu corpo está sempre em outro lugar. Está ligado a todos os outros lugares do mundo, e está num outro lugar que é o além do mundo. É em relação ao corpo que existe uma esquerda e uma direita, um atrás e um na frente, um embaixo e um em cima. O corpo está no centro do mundo, nódulo utópico a partir do qual penso, sonho, me comunico. O corpo, como a Cidade de Deus, não tem lugar, e é de lá que se irradiam todos os lugares possíveis. Apenas o espelho e o cadáver selam e calam essa voragem utópica. Os dois estão num outro lugar impenetrável, mas nesse momento já não sou eu mesmo. Para que eu seja eu mesmo, no meu corpo, sem utopia, é preciso uma situação bem definida. Só o ato amoroso, quando nos entregamos a ele, acalma a utopia do nosso corpo: por isso é tão próximo, no imaginário, ao espelho e à morte. É porque só no amor o meu corpo está AQUI."
"Todos estão na sarjeta. Mas alguns de nós olham para as estrelas."


Oscar Wilde


"E quem olha se fode."


Lori Lamby

Epígrafe do livro O caderno rosa de Lori Lamby, de Hilda Hilst, superindicado para lento deleite.

Para lento deleite II

I. Livros e putas podem-se levar para a cama.
II. Livros e putas entrecruzam o tempo. Dominam a noite como o dia e o dia como a noite.
III. Ao ver livros e putas ninguém diz que os dois minutos lhe são preciosos. Mas quem se deixa envolver mais de perto com eles, só então nota como têm pressa. Fazem contas, enquanto afundamos neles.
IV. Livros e putas têm entre si, desde sempre, um amor infeliz.
V. Livros e putas – cada um deles tem sua espécie de homens que vivem deles e os atormentam. Os livros, os críticos.
VI. Livros e putas em casa públicas – para estudantes.
VII. Livros e putas – raramente vê seu fim alguém que os possuiu. Costumam desaparecer antes de perecer.
VIII. Livros e putas contam tão de bom grado e tão mentirosamente como se tornaram o que são. Na verdade eles próprios muitas vezes nem o notam. Ano a fio alguém vai-se entregando a tudo “por amor” e um dia está lá como corpus bem corpóreo, na ronda das calçadas, aquilo que “para fins de estudo” sempre pairava somente acima delas.
IX. Livros e putas gostam de voltar as costas quando se expõem.
X. Livros e putas remoçam muito.
XI. Livros e putas – “Velha beata – jovem devassa”. Quantos livros não foram mal reputador, nos quais hoje a juventude deve aprender.
XII. Livros e putas trazem suas rixas diante das pessoas.
XIII. Livros e putas – notas de rodapé são para uns o que são, para as outras, notas de dinheiro na meia.


Walter Benjamin

Para lento deleite

Pois o amor não é doce,

pois o bem não é suave,

pois amanhã como ontem,

é amarga, a Liberdade

Cecília Meireles